lunes, 26 de octubre de 2009

Sobre Alguém Que Não é Comum...


Era uma vez a menina que não sabia mentir.

E eu gostava de vê-la por detrás da queda d'água, gostava de ver também a queda d'água de dentro dos olhos dela cada vez que ela dizia uma das suas milhões de verdades. A menina que não sabia mentir acreditava num mundo diferente, diferente inclusive de todos os mundos que já imaginei e precisei criar pra poder seguir intacta no meio desse roseiral cheio de beleza que se esconde entre espinhos.
A vida é assim, o que há de melhor sempre se esconde entre as dificuldades. Não se pode evitar a queda que precede o levantar, não há prazer nas viagens mais simples, não há felicidade sem a coragem de enfrentar a possibilidade de ganhar ou perder. Falo dos espinhos do roseiral. Mas não é sobre isso que quero falar. Quero falar-vos sobre a menina que não sabia mentir. Mas preciso recomeçar, sinto que não comecei como deveria.
Era uma vez a menina que não sabia mentir. E eu gostava de vê-la dormir enquanto pensava em toda a inquietude que ela me causava por dentro. A menina que não sabia mentir parecia quase sempre com um grande-pequeno-amigo de Antoine Saint Exupéry, e isso me fazia por vezes ter muito medo de parecer-me no final com uma raposa, mas com fé digo que não. Ela também tinha cabelos como os campos de trigo, e os olhos cheios de uma força que eu finjo não saber de quê. Uma cortina talvez, quem sabe...
Era uma vez a menina que não sabia mentir e uma rosa murcha roubada do canteiro da frente do único bar legal da rua inteira, uma quinta-feira que me fez feliz e eu. Era uma vez meu polegar rasgado, meu coração entregue, e a menina que não sabia mentir. Era uma vez Madrid-tão-grande-tão-duro-e-sem-encanto, a menina que não sabia mentir e eu, céu azul e vento frio, muito frio. Coração quente, muito quente. Satisfeito. Era uma vez eu, que gostava de ir ao lado da menina que não sabia mentir, eu que já havia aprendido a não sentir dor causada pelos extremos, nem extrema mentira, nem extrema verdade, porque isso também pode ferir às vezes. Eu que sempre me interessei pelo não dito, pelo que se esconde detrás das palavras explicadas, pelas verdades preservadas. Era uma vez meus abraços, os abraços dela, te-quiero-mucho e meu interesse de ir a qualquer lugar que me levasse pra mais perto da menina que não sabia mentir.
Era uma vez, e eu não sei o que virá depois disso nessa história... Só sei que quero muito que venha qualquer coisa bonita que nos faça continuar acreditando e remando até a outra extremidade desse rio que pode ser muito raso ou muito fundo, não se sabe ainda. Quero que depois do era-uma-vez exista uma semana bonita em Granada, Barcelona ou Paris, quero saber que houve olhos-nos-olhos sempre e quero que no final esteja escrito que foram-felizes ainda que não seja para-sempre, depois de um tempo a gente entende que isso não é o mais importante.
O importante hoje é ir assim, sabendo que faço parte de um era-uma-vez que tem a possibilidade de me transformar em alguém melhor do que sou, e que ao meu lado está a menina que não sabia mentir.

Por Dani Cabrera

5 comentarios:

  1. Seu texto é cheio de sensibilidade, adoro este tipo de narração. Poesia em prosa. Partilhando minha experiência, os rios que naveguei eram rasos quando eu tinha o coração amortecido; mas eram fundos como o oceano quando meu coração estava plenamente livre.

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  2. "eu que sempre me interessei pelo não dito, pelo que se esconde detrás das palavras explicadas, pelas verdades preservadas."
    Me identifiquei tanto com o seu texto, principalmente com essa frase.
    Beijo

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  3. "eu que sempre me interessei pelo não dito, pelo que se esconde detrás das palavras explicadas, pelas verdades preservadas."
    Me identifiquei tanto com o seu texto, principalmente com essa frase.
    Beijo

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  4. Tirei um tempinho para dar uma atualizada nas minhas leituras dos blogs mais variados, e acabei me deparando com sua deliciosa forma de se expressar, retornarei mais vezes, grande beijo

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  5. vc sempre arrebenta!!!!:)adorei o texto.

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